Entidade pede medidas urgentes, responsabilização solidária e campanhas de alerta após explosão de fraudes que usam a identidade de advogados para extorquir vítimas
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| Sede da OAB-PI |
A Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Piauí ingressou na Justiça Federal com uma ampla Ação Civil Pública que mira 17 empresas, entre instituições financeiras, operadoras de telefonia e plataformas digitais, por falhas que, segundo a entidade, viabilizam e aceleram a disseminação do chamado “Golpe do Falso Advogado”. O esquema, que já vitimou mais de 130 piauienses e cerca de 17,5 mil brasileiros, envolve perfis falsos no WhatsApp, apropriação indevida da imagem de advogados reais e transferências via PIX para contas bancárias fraudulentas.
No processo, a OAB-PI afirma que o golpe deixou de ser uma ocorrência isolada para se transformar em um fenômeno criminoso de larga escala, sustentado por uma cadeia de fragilidades envolvendo abertura de contas bancárias, habilitação de linhas telefônicas pré-pagas e a lentidão na remoção de perfis falsos em plataformas digitais. A entidade argumenta que a atividade dos golpistas só se tornou possível devido à “falha estrutural e sistêmica” de bancos, prestadores de serviços de pagamento, operadoras e do WhatsApp, todos citados como corresponsáveis pela continuidade e expansão da fraude.
A ACP lista como rés instituições como Caixa, Banco do Brasil, Itaú, Bradesco, Santander, Inter, Nubank, Mercado Pago, PagBank, PicPay, C6 Bank, Original e Pan, além das operadoras Claro, Vivo e TIM e da plataforma WhatsApp, representada pela Meta. Para a OAB-PI, cada um desses setores exerce um papel determinante no golpe: os bancos permitiriam a abertura de contas “laranjas” com baixa verificação de identidade; as operadoras facilitariam o uso de linhas telefônicas anônimas e vulneráveis a fraudes como o SIM swap; e o WhatsApp permitiria, por longos períodos, o funcionamento de perfis falsos usados pelos criminosos para se passar por advogados.
Segundo o documento, o golpe segue uma estrutura em três fases. A primeira, chamada de “mineração”, consiste na obtenção ilícita de dados de processos judiciais — como nomes das partes, valores e documentos autênticos — que dão credibilidade ao criminoso. A segunda é a fase de abordagem, quando o golpista cria um perfil falso no WhatsApp com o nome e foto do advogado da vítima e, munido de informações reais do processo, convence o cidadão de que é legítimo. Na terceira etapa, ocorre a indução ao pagamento: sob o pretexto de liberar alvarás, custas ou precatórios, o criminoso orienta a vítima a realizar transferências via PIX para contas fraudulentas, que rapidamente pulverizam os valores dentro da chamada “janela de minutos” — tempo insuficiente para bloqueio bancário.
A OAB-PI sustenta que essa dinâmica só prospera porque os bancos falham em detectar transações atípicas, não ativam o Mecanismo Especial de Devolução (MED) com a agilidade necessária e não bloqueiam a cadeia de repasses. As operadoras, por sua vez, não garantem mecanismos eficazes para rastrear linhas telefônicas usadas para criar perfis falsos. Já a plataforma WhatsApp, de acordo com a ação, mantém por dias ou semanas contas fraudulentas mesmo após denúncias repetidas, tornando-se o principal ambiente de execução do crime.
Diante desse cenário, a Ordem afirma que há “grave ruptura da confiança social” e um abalo direto à advocacia, já que o golpe se apropria da imagem de profissionais para enganar cidadãos. Por isso, pede a responsabilização civil solidária das empresas, incluindo a reparação de danos materiais e morais às vítimas e o pagamento de indenização por dano moral coletivo, a ser destinado ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos (FDD).
Além das reparações financeiras, a ACP solicita a adoção imediata de medidas estruturais e emergenciais. Entre elas, a criação de canais exclusivos e permanentes de comunicação entre bancos, operadoras, OAB-PI e Polícia Civil; bloqueio preventivo de contas suspeitas; resposta obrigatória em prazos de horas para perfis falsos no WhatsApp; e reforço dos procedimentos de segurança no cadastramento de linhas telefônicas. A entidade exige ainda que as rés financiem campanhas de utilidade pública alertando que advogados e juízes não solicitam pagamento de custas por WhatsApp ou PIX, medida considerada crucial para frear a ação dos golpistas.
A ação também fundamenta seus pedidos em dispositivos do Código de Defesa do Consumidor, da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e do Marco Civil da Internet, afirmando que todas as empresas possuem dever legal de garantir segurança, prevenção de danos e resposta eficiente a fraudes digitais. Para a entidade, a omissão dessas corporações resultou em um ambiente fértil para golpes que causam prejuízos diários a cidadãos vulneráveis e abalam a confiança nas instituições de justiça.
A ACP será analisada pela Justiça Federal do Piauí, responsável por julgar ações em que a OAB, como autarquia sui generis, figura no processo. Caso a tutela de urgência seja concedida, bancos, operadoras e o WhatsApp deverão implementar mecanismos de resposta acelerada que possam estancar o avanço do golpe e criar uma nova política de segurança digital alinhada ao ritmo das fraudes eletrônicas.
