De aliado de Lula a porta-voz do bolsonarismo, senador acumula articulações políticas e suspeitas que o colocam no centro das tramas do poder
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| O senador Ciro Nogueira (PP-PI). Créditos: Pedro Ladeira/Folhapress |
Figura chave nos bastidores da política nacional, o senador Ciro Nogueira (PP-PI) trilhou uma carreira marcada por habilidade em negociações e envolvimento com diferentes governos. Hoje, se posiciona como um dos rostos mais barulhentos da oposição ao presidente Lula, mesmo após ter construído sua trajetória apoiando o petista. A guinada conservadora, que o colocou como um dos principais articuladores do bolsonarismo no Congresso, levanta dúvidas não apenas pela mudança de discurso, mas também pelo histórico de investigações e escândalos que o cercam.
Natural do Piauí, um dos maiores redutos eleitorais de Lula, Ciro construiu sua base sob a sombra da popularidade do ex-presidente. No entanto, no atual cenário político, atua nos bastidores com articulações para desestabilizar o Planalto. Durante entrevista à GloboNews, protagonizou um discurso recheado de distorções, como alegar que mudanças no IOF afetariam os mais pobres, ao mesmo tempo em que defendia interesses de grandes fortunas — uma narrativa que se encaixa com o chamado “golpe dos ricaços”, articulado por figuras centrais do Congresso.
Histórico de suspeitas
Apesar de nunca ter sido condenado, Ciro Nogueira figura em uma série de investigações ao longo das últimas décadas. Entre elas, o recebimento de propina da Odebrecht e da UTC Engenharia, suborno para alterar depoimentos no caso do “Quadrilhão do PP”, e transações suspeitas com empreiteiras como OAS e Engevix. Também é citado na CPI das Bets por sua proximidade com empresários de plataformas de apostas e envolvimento em operações de alto valor.
Em sua passagem pela Casa Civil durante o governo Bolsonaro, teve papel decisivo na gestão do orçamento secreto, um dos episódios mais controversos dos últimos anos. Fora do Congresso, o uso de verbas públicas para abastecer jatinhos particulares — inclusive durante o recesso parlamentar — também levanta questionamentos. Somente entre 2019 e 2023, os gastos com combustível de aviação superaram os R$ 600 mil.
Sua mãe, Eliane Nogueira, que assumiu interinamente seu mandato no Senado, também está envolvida em gastos questionáveis com aeronaves e carros de luxo pagos com recursos do erário. Já a empresa da família, a Ciro Nogueira Agropecuária e Imóveis, aparece em operações imobiliárias suspeitas de lavagem de dinheiro, com valores bem acima da média de mercado.
Principais investigações e denúncias envolvendo Ciro Nogueira:
1 Propina da Odebrecht – R$ 7,3 milhões
Acusado de receber propina da empreiteira para favorecer negócios da Braskem. Usava codinomes como “Piqui” e “Cerrado”. STF anulou provas da delação.
2 Suborno da UTC Engenharia – R$ 2 milhões
Delações apontam pedido de pagamento em troca de influência em obras públicas no Piauí. Encerrado por falta de provas.
3 Obstrução de Justiça no “Quadrilhão do PP”
4 Apoio a empreiteiras OAS e Engevix
Investigações jornalísticas revelaram possíveis favorecimentos em medidas provisórias e financiamento da Caixa. Processos seguem sob sigilo.
5 CPI das Apostas e ligação com o “Jogo do Tigrinho”
Apareceu ligado a empresário investigado por plataformas de jogos ilegais. Ex-assessor recebeu R$ 625 mil em transação suspeita com o empresário.
6 Orçamento secreto
Participou da coordenação do esquema de emendas parlamentares sem transparência durante o governo Bolsonaro.
7 Uso de dinheiro público para abastecer jatinhos
Só em 2023, usou mais de R$ 53 mil em combustível de aviação. Entre 2019 e 2021, os gastos somaram R$ 580 mil — muitos em períodos de recesso.
8 Gastos suspeitos de sua mãe, Eliane Nogueira
Enquanto senadora suplente, também gastou verba pública com abastecimento de aviões que não possuía, além de carros de luxo alugados com dinheiro público.
9 Negócios da família Nogueira sob suspeita
Empresas da família teriam sido usadas para lavar dinheiro, com transações imobiliárias superfaturadas envolvendo o mesmo empresário das apostas online.
O “moralista” de ocasião
Apesar do discurso inflamado contra a corrupção e a defesa de uma suposta moralidade pública, Ciro carrega uma trajetória marcada por práticas clientelistas, favorecimentos e denúncias arquivadas por falta de provas — em boa parte, por votos favoráveis de ministros indicados por aliados.
A figura que hoje se apresenta como antagonista de Lula é, na verdade, produto de décadas de trânsito entre governos de esquerda, centro e direita. Especialista em sobreviver às mudanças de ventos políticos, Ciro molda sua atuação à conveniência do momento — seja vestindo a camisa do petismo, seja brandindo a retórica bolsonarista.
No cenário atual, volta aos holofotes como símbolo da elite política que deseja preservar privilégios, travestido de fiscal da ética. Resta saber por quanto tempo esse papel será sustentado diante do peso das contradições que o cercam.
Fonte: Revista Forum